Sou viajante por natureza, algo sempre me impulsionou a buscar novas experiências.
Eu amo viajar a cavalo porque é a mais pura sensação de conexão com a natureza que encontrei, me sinto totalmente integrado com o mundo ao meu redor, ouvindo todos seus diferentes sons e sentindo uma energia que não consigo quando não estou a cavalo.
Há cerca de dez anos resolvi buscar os melhores destinos do Brasil para cavalgar e oferecer aos clientes da agencia Cavalgadas Brasil. Viajei para 17 estados (RS – SC – PR – SP – RJ – ES – BA – PE – RN – PB – CE – SE – PA – GO – MG – MT – MS) buscando destinos que reunissem as condições necessárias para a organização de uma boa cavalgada. (Destino, cavalos, pessoal e infra- estrutura). Infelizmente apesar de encontrar inúmeros locais excelentes, poucos reuniam as condições mínimas necessárias.
Hoje vou escrever sobre um deles, muito especial e que só agora após alguns anos e várias viagens, considero ter alcançado o padrão mínimo de qualidade e segurança necessários. As belezas e a cultura singular da Ilha de Marajó são cenários perfeitos para quem deseja desvendar a cavalo, um pedaço quase intacto da Amazônia.
Cercada pelo oceano Atlântico e pelos rios Amazonas e Tocantins, a Ilha de Marajó tem paisagem diversificada e exuberante – a vegetação vai desde alagados à floresta amazônica – com muitos rios, belas praias de água doce e salgada, grande variedade de pássaros, animais e muitos búfalos em toda parte.
Com paisagem exótica, a ilha faz parte de um arquipélago que compreende mais de 500 ilhas e ilhotas espalhadas na foz do rio Amazonas. O lado leste da ilha aonde cavalguei, é uma imensa planície coberta de savana; o Oeste é coberto por densas florestas.
Uma das dificuldades de organizar uma boa travessia a cavalo pela Ilha é o clima. No Marajó há somente duas estações: verão, a estação seca, nos meses de julho até dezembro – quando os campos ficam completamente secos e o solo rachados, como em um deserto – e o inverno, a estação chuvosa, nos meses de janeiro até junho, quando a ilha fica parcialmente inundada e forma um grande pantanal.
Visitei a ilha em épocas diferentes para tentar encontrar o período ideal. No pico do verão, a seca é muito forte e os animais mais fracos não sobrevivem, é comum encontrar animais mortos (infelizmente inclusive cavalos) pelo caminho. No inverno é impossível percorrer longas distancias a cavalo.
Das onze raças brasileiras de cavalos, a Ilha do Marajó é habitat de duas, o cavalo Marajoara e o Puruca. Só isso já seria razão para meu interesse pela ilha, mas tem muito mais; devido a seu grande isolamento por muitos anos, a região tem uma cultura equestre única. Os vaqueiros, como são chamados aqueles que lidam com os búfalos (tem mais de 700 mil búfalos na Ilha) ainda mantem tradições muito rústicas e antigas.
Seus equipamentos são na grande maioria produzidos localmente. Uma tradicional selaria produz um tipo de sela, com couro de búfalo, que tem características únicas. O tipo de cabeçada também é bastante diferente e único no Brasil.
Merece destaque a culinária da região – no Pará a floresta amazônica deu origem a uma das mais típicas e surpreendentes cozinhas do Brasil. Da natureza rica em ervas, sabores e cheiros nasceu a gastronomia paraense, considerada a mais autêntica e exótica do país. A variedade de peixes e frutas é surpreendente. Em alguns lugares o peixe é alimento básico: peixe com pirão, farofa e açaí. Eu que gosto de açaí e não como carne vermelha, encontrei na região um paraíso gastronômico! (Para quem gosta, dizem que os files de búfalo são muito bons!)
Os ritmos de Marajó são contagiantes e uma das tradições da cultura marajoara é o Carimbó. A dança e o ritmo tiveram início com os antigos escravos da época colonial, que se divertiam nas fazendas buscando sons nos tambores e instrumentos feitos de material natural da floresta.
Outro destaque da Ilha é sua cerâmica. Na antiguidade Marajó foi habitada por nações indígenas de cultura avançada, que produziram uma arte de considerável beleza plástica chamada genericamente de cerâmica marajoara. Único caso em todo o país, algo surpreendente, considerado nosso tamanho continental.
Cavalguei em várias fazendas, passando por praias, campos e alagados. Ajudei na ‘Tocagem de Búfalos’, ou tanger o gado como eles dizem. Na ilha, os búfalos estão em toda parte e são usados na alimentação, como meio de transporte e até como montaria da polícia. Faz parte dos roteiros turísticos locais um passeio de búfalo, eu, é claro, também experimentei uma voltinha. Nada especial, mas valeu como mais uma experiência.
As fazendas onde me hospedei e por onde passamos, são todas antigas e muito tradicionais. As conversas com os fazendeiros e os vaqueiros, durante a cavalgada, observar seus costumes e sua lida são experiências que me fizeram refletir como nosso Brasil é rico e tem enorme potencial de desenvolvimento turístico!
Por Paulo Junqueira Arantes
Cavaleiro profissional e Diretor da agência Cavalgadas Brasil
www.cavalgadasbrasil.com.br