Clonagem de cavalos: o que você precisa saber

Luciano Rodrigues, cavaleiro e pesquisador, conta uma história de clonagem de cavalos e explica tudo sobre o assunto. Confira!

Considerado um dos melhores jogadores de polo do mundo, Adolfo Cambiaso acumula títulos. No dia 19 de dezembro de 2020 conquistou pela oitava vez consecutiva o Abierto Argentino de Polo, um dos principais campeonatos mundiais dessa modalidade praticada com cavalos. Sua equipe, La Dolfina, enfrentou na final a invicta Ellerstina. Vitória para La Dolfina por 10 a 8.

Contudo, nos últimos anos, algo chama a atenção: os animais utilizados por Cambiaso nas partidas. A destacar, na final do Abierto Argentino de Polo 2020, Cambiaso usou três éguas: Dolfina B01 Cuartetera, Dolfina B06 Cuartetera e Dolfina B09 Cuartetera. Todas são clones de Dolfina Cuartetera (foto).

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Clonando animais

Quem não se lembra da ovelha Dolly, primeiro mamífero clonado. Certamente, um caso de sucesso da ciência. Só para ilustrar, feito através de um procedimento de clonagem a partir de células adultas. Em 1997, os biólogos Keith Campbell e Ian Wilmut apresentaram o clone.

“Não tinha nascido de um óvulo com um espermatozoide, mas provinha de uma célula glandular mamária de outra ovelha que já não estava viva, uma Finn Dorset de seis anos de idade”.

O tema é complexo, quer seja pelo procedimento científico, quer seja pelo ponto de vista ético e legal. Grosso modo, clonagem é o procedimento de ‘copiar’ geneticamente um indivíduo. Assim sendo, pega os ‘dados’ de um indivíduo e coloca em um óvulo enucleado.

Ainda está difícil? Vamos lá! Existem duas formas de reprodução: assexuada e sexuada. Na reprodução assexuada um organismo produz descendentes idênticos sem a necessidade de outros organismos. Podemos ver esta forma de reprodução em algumas bactérias, protozoários, plantas como a cana de açúcar, fungos, algas, mudas de plantas, entre outros.

Na reprodução sexuada existe a necessidade de outro organismo, como acontecem em grande maioria dos animais e seres humanos. Cada indivíduo contribui com sua parcela genética. Por isso os descendentes são diferentes dos progenitores, pois há a combinação genética (cruzamentos).

No caso da clonagem, é uma reprodução de indivíduos sexuados através de técnicas assexuadas. Retira do óvulo o núcleo contendo material genético (DNA) e introduz em seu lugar o material genética do indivíduo a ser clonado. Esse óvulo, então, é colocado numa barriga de aluguel para dar sequência na gestação.

Clonagem de cavalos e outros animais no Brasil

No Brasil, ainda há discussões sobre o uso da clonagem. Porém, vale destacar que há uma legislação para isso. A Lei de Biossegurança, nº 11.105, promulgada em março de 2005. Regulamenta, antes de tudo, este e outros procedimentos.

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, oferece o serviço de clonagem. Assim como outras empresas. Vitória da Embrapa é o primeiro clone bovino da América Latina, uma fêmea da raça Simental (17 de março de 2001).

Outro marco importante realizado pela Embrapa é a Lenda da Embrapa. Fêmea da raça holandesa, primeiro clone a partir de células somáticas de um animal morto. De fato, esse feito “abre para a ciência um excelente precedente. Já que além de possibilitar a recuperação de animais de alto valor produtivo, pode ser usada também para regenerar animais silvestres ameaçados de extinção” (EMBRAPA, 2021).

Com cavalos, em 2012, temos o nascimento do primeiro clone equino no Brasil. Um clone, aliás, do cavalo da raça mangalarga, Turbante JO. Algumas associações, como a ABQM e ABCCC, não autorizam o uso da técnica para registro genealógico.

Em contrapartida, a Associação Brasileira de Criadores de Cavalo Mangalarga Marchador regulamenta o registro de animais clonados em seu artigo 51: “será permitida a inseminação artificial e transferência de embriões como métodos reprodutivos artificiais sexuados e a clonagem como método reprodutivo artificial assexuado”.

Luciano Rodrigues, cavaleiro e pesquisador, conta uma história de clonagem de cavalos e explica tudo sobre o assunto. Confira!
Crédito: EMBRAPA

Questões éticas sobre a clonagem de cavalos

Interessante acompanhar o avanço da biotecnociência e da biotecnologia quando se esbarra nos princípios e normas das associações de criadores. Inegavelmente, não só nas associações, mas também na própria conduta ética e legal no ordenamento jurídico brasileiro com a clonagem humana.

Adolfo Cambiaso afirma que realizou a clonagem de Cuartetera a fim de perpetuar sua qualidade técnica como jogador. Seria, então, Cambiaso jogador de um único animal? Óbvio que não! Sua qualidade técnica é inquestionável. Mas há na clonagem a necessidade de ‘perpetuar’ um exemplar da raça e suas qualidades raciais. Em conclusão, esse é o ponto: para qual finalidade?

Michel Sandel diz que tudo tem um valor. Com a clonagem estamos a um passo para comprar a eternidade. Seria então questões financeiras? Clonar para vender? Apego sentimental?

O caso de Cambiaso entrou na discussão pelos os autores César Torres e Francisco Frías. Eles apresentam em seu artigo ‘Polo, clonación y ética’ questões pertinentes para uma reflexão. Em primeiro lugar, todos tem acesso a essa biotecnologia vantajosa? Teria, do ponto de vista ético esportivo, um equilíbrio competitivo?

Por outro lado, falam sobre as habilidades, seja ela dos cavalos ou do jogador no desenvolvimento e aprimoramento para a adaptação a novos animais com habilidades distintas e estratégias diferentes. Com clones a habilidade seria sempre a mesma.

Dessa forma, os autores fazem inúmeras críticas a clonagem. Acreditando ser de importância e não citado pelos autores, seria a clonagem a longo prazo, esquecendo dos fatores biológicos para o desenvolvimento da espécie. Clonar, sem deixar a natureza agir para a adaptação e desenvolvimento ao ambiente.

Por um lado, temos a importância da pesquisa sobre biotecnologia. Por outro, esbarramos em questões ético-legais que norteiam a conduta humana. Este embate sempre teremos, que seja pela vida e não pelo dinheiro.

Referências

ABCCMM. Associação Brasileira de Criadores de Cavalo Mangalarga Marchador. Regulamento do Serviço de Registro Genealógico do Cavalo Mangalarga Marchador. Belo Horizonte: ABCCMM, 2018.

COHEN, Jon. Sixclonedhorses help riderwinprestigious polo match. Disponível em: https://www.sciencemag.org/news/2016/12/six-cloned-horses-help-rider-win-prestigious-polo-match. Acessado em: 23 dez 2020.

COHEN, Haley. Game of clones. Disponível em: https://equine-empathy.com/2015/07/21/game-of-clones/. Acessado em: 23 dez 2020.

EMBRAPA. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Clonagem animal: evolução para a ciência no Brasil. Disponível em: https://www.embrapa.br. Acessado em: 05 jan. 2021.

POLOLINE. La Dolfina Saudi wineighthconsecutive Argentine Open titleat Palermo. Disponível em: https://www.pololine.com/news/la-dolfina-saudi-win-eighth-consecutive-argentine-open-title-at-palermo/. Acessado em: 23 dez 2020.

SANDEL, Michel. O que o dinheiro não compra: os limites morais do mercado. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.

TORRES, César R.; FRÍAS, Francisco Javier López. Polo, clonación y ética. Disponível em: https://www.pagina12.com.ar/110138-polo-clonacion-y-etica. Acessado em 23 dez. 2020.

Colaboração: Luciano Ferreira Rodrigues Filho
Cavaleiro e Pesquisador |
Campeira Dom Herculano
Crédito da foto de chamada: Divulgação/Pinterest

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