Doenças Ortopédicas do Desenvolvimento (DOD) dos Equinos

São consideradas uma das maiores dificuldades encontradas pelos grandes criadores em todo o mundo, pois além de apresentarem grande incidência, podem comprometer o desempenho atlético dos animais.

O termo DOD refere-se a qualquer distúrbio hereditário ou adquirido, que interfira o desenvolvimento e a formação dos ossos e articulações dos potros em crescimento. Basicamente, o que ocorre é uma alteração no processo de ossificação endocondral, durante o crescimento ósseo. As DOD’s mais comuns são: Fisites, Osteocondrose  (Lesões Subcondrais Císticas e Osteocondrite Dissecante), Deformidades Angulares e Deformidades Flexurais .

Existem diversos fatores comuns que contribuem a formação das DOD: fatores hereditários (genéticos), fatores nutricionais, traumas, exercício físico precoce e/ou em terrenos duros e disfunção hormonal (Hipotireoidismo).

Quanto aos fatores hereditários, podemos considerar a raça do animal, pois as raças grandes apresentam uma taxa de crescimento maior que as demais, os problemas de conformação, tipo corpóreo, estrutura óssea e massa corporal que são características transmitidas geneticamente que podem gerar pressão excessiva na placa de crescimento.

Já os fatores nutricionais, marcam como sendo um dos principais vilões no desenvolvimento das DOD. O fornecimento de dietas ricas em energia, acelera a taxa de  crescimento do animal o que faz com que o processo de diferenciação celular da cartilagem seja insuficiente provocando falha na ossificação endocondral deixando a placa metafisária espessada. Além disso, a aceleração do crescimento faz com que os tecidos moles não acompanhem os ossos. Outro fator importante relacionado à alimentação, é iniciar o fornecimento de ração para os potros mamando no máximo com três meses de idade, isso porque nesta fase o leite da égua já não é mais nutricionalmente eficaz, e ainda o potro não terá uma perda de peso tão significativa quando for desmamado.

Normalmente, na fase do desmame, o potro tem uma grande perda de peso, que geralmente é compensada com o início do fornecimento ou um aumento da quantidade de ração, isso faz com que o animal ganhe peso de uma só vez, o que é chamado de ganho de peso compensatório, que é um dos momentos mais marcantes de início das DOD’s, pois além do ganho de peso abrupto, ocorre também um crescimento rápido.

O desbalanço mineral está ligado não só as quantidades dos minerais contidas nas rações, mas também, no quanto que eles são capazes de ser absorvidos pelo organismo. Isso porque muitas dietas contém os níveis necessários dos minerais, porém a digestibilidade é baixa, logo, a quantidade suficiente para a manutenção do animal não está sendo absorvida, e se ele ainda estiver na fase de crescimento pode-se iniciar alterações no desenvolvimento.

Os principais minerais relacionados à alterações na ossificação endocondral são cálcio, fósforo, zinco e cobre. O excesso de fósforo na dieta, imobiliza a utilização do cálcio pelo organismo promovendo sua deficiência. Sabemos que o cálcio é fundamental para o processo de ossificação, logo sua falta predispõe à DOD. O consumo insuficiente de cobre também é prejudicial para a formação óssea já que este encontra-se envolvido na estabilização do colágeno e na síntese de elastina óssea. A sua deficiência pode levar a Fisites e contratura dos tendões flexores. A ingestão excessiva do zinco diminui a absorção do cálcio e do cobre, estando assim, também ligado as doenças de desenvolvimento.

As Deformidades Flexurais são manifestações que podem se desenvolver durante o período gestacional, no momento ou após o parto, consideradas congênitas ou podem se desenvolver durante o período de crescimento, conhecidas como adquiridas. A maioria das ocorrências congênitas se dão devido ao mal posicionamento no útero, ou em casos de éguas prenhes obesas, que  devido a quantidade de gordura abdominal tem seu espaço uterino diminuído.

O fator nutricional da égua, principalmente o nível de proteína durante o terço final de gestação também é fundamental para o desenvolvimento do potro. As alterações mais comuns são as deformidades flexoras em boleto ou em carpo, que normalmente afetam os dois membros. O encurtamento do tendão flexor digital superficial e profundo pode ser tão severo que o potro chega a ajoelhar sobre o próprio boleto. Deformidades flexoras de carpo envolvem a contratura da fáscia cárpica e do ligamento palmar. A maioria das deformidades associadas ao mal posicionamento uterino melhoram espontaneamente, em casos graves é necessário a implantação de talas, a realização de massagens, casqueamento corretivo, uso de drogas parenterais e em casos extremos cirurgias.

Deformidade flexural grave

Já as Deformidades Flexoras Adquiridas estão em sua maioria relacionadas à dor. Qualquer dor provocada por Fisites, OCD, Osteocondrose, lesões nos cascos, pode iniciar um reflexo de retirada do membro do solo (flexão), que resultará em contração dos músculos flexores e posicionamento errado da articulação. Além disso, as dietas ricas em energia podem acelerar o crescimento de forma que os tendões e ligamentos não acompanhem o crescimento ósseo. Essas lesões são mais observadas nas articulações Metacarpofalangeana e interfalangeana distal. O tratamento cirúrgico muitas vezes é necessário se o conservativo com massagens, fisioterapia e aparação corretiva dos cascos não é responsiva.

As Deformidades Angulares Adquiridas são aquelas em que o potro nasce normal, com bons aprumos, sem nenhuma alteração e que começam a desviar nas primeiras semanas ou meses de vida. Estas lesões podem ocorrer por vários fatores, desde mal posicionamento uterino como por apoio  excessivo em um membro (contrapeso), supernutrição, potros com crescimento rápido, exercício físico precoce,  casqueamento inadequado, peso corporal elevado para o tipo de estrutura óssea, enfim, por qualquer situação que cause uma pressão assimétrica nas placas de crescimento provocando alteração na ossificação endocondral.

Esse trauma na placa metafisária leva a um espessamento que diminui a nutrição da cartilagem o que resulta em um retardo do crescimento. Se isso ocorrer apenas em um lado, há um desvio do membro. As alterações são bastante visíveis, e pode acometer um ou mais membros, normalmente nos ossos do carpo ou tarso. O tratamento baseia-se em repouso forçado, alimentação controlada inclusive da égua se estiver acima do peso, aplicação de gesso em casos de instabilidade articular, ou cirúrgicas (transcecção do periósteo, fixação de grampo, parafuso e/ou fio de aço). O prognóstico destas lesões é bastante variável à idade do animal e ao tempo de implantação do tratamento.

A Fisite, conhecida anteriormente como Epifisite, é uma das alterações mais frequentes e visíveis em potros em crescimento, caracterizada pelo aumento de volume da placa de crescimento metafisário distal (fise ou cartilagem metafisária), que acomete os ossos longos (principalmente rádio, terceiro osso metacárpico e metatársico) e algumas vértebras cervicais. O quadro ocorre principalmente entre o 4º  e 8º  mês de idade, tendo maior incidência em potros que apresentam um crescimento rápido ou com peso acima da média,  que recebem dieta rica em energia ou com desequilíbrio mineral. A Fisite também é bastante observada em potros com um ou dois anos de idade que estão entrando em treinamento. O exercício físico em animais que ainda não completaram o processo de calcificação da cartilagem, ou seja, que estão com a fise aberta,  promove a ação forças compressoras sobre a cartilagem metafisária, levando à diminuição no suprimento sanguíneo da metáfise, gerando um retardo provisório da calcificação e um aumento da sobrevivência dos condrócitos o que ocasiona um espessamento da fise.

Além disso, se a força compressora for ainda maior que os limites fisiológicos, pode ocorrer uma parada completa da ossificação endocondral resultando em desvios de aprumos. Os sintomas são: aumento de volume local, podendo apresentar aumento de temperatura e dor à palpação, a claudicação pode ser leve à intensa, intermitente ou não, dependendo da gravidade da lesão. Normalmente os quadros são leves e autolimitantes, desaparecendo com o fechamento das placas metafisárias. Sem dúvida nenhuma para que problema seja interrompido ou para prevenir a Fisite, é fundamental cessar o treinamento, diminuir a quantidade de ração e o fornecimento de feno de alfafa, e corrigir o desbalanço mineral.

A Osteocondrose é um distúrbio na diferenciação celular na cartilagem em crescimento que resulta em uma falha na ossificação endocondral (formação óssea) e persistência da cartilagem hipertrofiada. Essa falha na ossificação leva a necrose da  cartilagem espessada, que com estresses físico subsequentes sofre fissuras. Pode afetar tanto a cartilagem metafisária quanto a cartilagem articular. A degeneração progressiva da cartilagem pode levar à formação de lesões dissecantes na cartilagem, caracterizada como necrose isquêmica do osso subcondral que resultam em ‘flaps’ ou em pedaços soltos de cartilagem (Osteocondrite Dissecante – OCD), ou também levam à formação de cistos ósseos subcondrais (Osteocondrose Cística), que podem ocorrer por persistência de áreas localizadas de cartilagem degenerada no interior do osso subcondral ou por penetração de líquido sinovial através da falha na cartilagem articular.

Ambas as lesões podem ocorrer não só no mesmo animal, como também nos mesmos ossos, e são mais comuns nas articulações femorotibiopatelar, tibiotársica e escapuloumeral, porém também afetam o terceiro osso metatársico e metacárpico. Os potros de seis meses à dois anos de idade são os mais afetados, apresentam distensão articular, sinovite e podem ou não, apresentar claudicação evidente e dor. Os fatores que parecem predispor um animal em crescimento à Osteocondrose (OCD ou cística) incluem crescimento rápido, predisposição genética, excesso e desequilíbrio nutricional e trauma repetido à cartilagem.

Baseado em todos estes fatos, podemos concluir que a prevenção das doenças ortopédicas do desenvolvimento começa com a boa alimentação da égua em gestação,  e  continua com a nutrição balanceada dos potros desde o nascimento. Além disso, é fundamental um bom manejo e criação, evitar o trabalho precoce (antes de 10 meses de idade) e realizar bons cruzamentos genéticos.

Por Cláudia Ceola
Médica Veterinária e Supervisora Técnica de Equinos da Guabi Nutrição e Saúde Animal

 

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