Como será que é a relação do pai/treinador com a filha/amazona?

Participantes do Campeonato Nacional de Rodeio – CNR nos três tambores contam como é viver a vida dos rodeios e ainda conviver em casa

Eventualmente, o relacionamento entre mestre e aprendiz pode ser complicado. As lições a serem aplicadas pelos treinadores, muitas vezes, chegam aos ouvidos dos alunos de forma amarga. ‘Poxa, me esforço tanto, onde será que estou errando’? ou ‘Porque será que ele exige tanto de mim?’ ou ainda ‘O que fazer para elas entenderem que só quero que sejam as melhores dentro e fora da pista?’.

Será que são esses os questionamentos que surgem em uma relação tão próxima? Se você precisa confiar 100% no seu treinador, e vice e versa, imagina adicionar nessa equação o sentimento de pai e filha. Isso é muito comum de vermos em diversas modalidades equestres. Muitos jovens começam no esporte por inspiração dos pais, que já vivem nessa função. E acabam sendo treinados por eles. Contando treino, viagens, competições e o dia a dia em casa, são 24 horas juntos.

Campeonato Nacional de Rodeio
Claudecir e Maria Fernanda

Claudecir Zamai, 54 anos, de Loanda/PR, desde menino anda a cavalo e sempre gostou de trabalhar no manejo com o gado. Nunca imaginou tornar-se treinador, principalmente nos três tambores. O incentivo para que tudo começasse foi a paixão e a insistência da filha, que motivou toda a família a gostar do esporte. “Em 2016, fiz um curso com o Sidnei Junior, para melhorar meu aprendizado e ter segurança para passar as informações. O objetivo é ajudar a minha filha, mas não me considero um profissional na área”, conta.

O sentimento é de parceria impera nessa relação. “Gosto de estar na lida com os cavalos e tenho muita alegria a cada conquista, o que é gratificante. Agradeço a Deus por ter minha filha para me ajudar e me apoiar no que eu gosto. A nossa relação é de respeito, sabemos do nosso limite. Também respeito às atitudes da minha filha, pois sei que ela sempre está tentando fazer o seu melhor na hora da competição”, reforça.

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Claudecir e Maria Fernanda

Para ele, o que importa é focar em que ela faça sempre uma boa prova. “Termos essa relação dentro e fora das pistas, ajuda, com certeza. Estamos sempre juntos, um escutando o outro. Durante a competição, passo apenas algumas informações para ela, detalhes sob um olhar de quem está ‘de fora’, consigo ver ângulos diferentes. Porém, é no treino que corrigimos nossos erros e tentamos fazer tudo da forma correta”.

Para Maria Fernanda Zamai, 23 anos, também de Loanda/PR, que há nove compete nos três tambores, sempre com o apoio da família, ser treinada pelo pai é muito gratificante. “Tenho muito orgulho dele por toda dedicação que tem comigo e com nossos animais. Acredito que, a partir do momento que ele começou a me treinar, fomos melhorando a cada competição. Ele me ajuda muito mais do que atrapalha (risos)”, expõe.

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Valdemir e Bia

A amazona destaca alguns pontos negativos. Como não é apenas uma relação de prestação de serviços, quando não concordam com algo em determina situação, entra em jogo o sentimento de pai e filha. Mesmo que seja um momento mais delicado, logo conseguem resolver. “Temos a liberdade de conversar sobre cada passada, ficamos horas refletindo o que erramos e o que temos a melhorar. Além dele me manter calma para acertar os pontos de entrada e fazer uma boa passada, pois afinal, ele me conhece desde bebê e sabe quando estou nervosa ou com medo”.

Há cobrança, mas segundo ela, acontece de uma forma diferente. Os dois têm os mesmos objetivos, que é o de subir ao pódio, então a sintonia é perfeita. “Acredito que conseguimos diferenciar momentos de profissionalismo da nossa relação de pai e filha, pois nos respeitamos muito. Sei o quanto ele se esforça para treinar nossos cavalos e o quanto ele deseja que eles estejam na minha mão para uma boa competição. Infelizmente, não tenho meu pai 24 horas em casa, porque moro em outra cidade para estudar. Mas durante a semana, estou sempre perguntando como estão os cavalos, o treinamento. E nos finais de semana que estou em casa, ficamos o tempo inteiro falando de cavalos, treinando e cuidando deles”, reforça.

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Valdemir e Bia

Aos 50 anos, Valdemir Sanchez Martinez, de Glória de Dourados/MS, tornou-se profissional há dois anos, quando começou a acompanhar a filha nas provas. O sentimento que define essa relação é o de orgulho, segundo ele. “Tenho orgulho de ter uma filha que luta pelo seu ideal. Sempre fomos apaixonados pelo mundo do cavalo e o tambor só veio para selar ainda mais ainda nossa parceria. Nossa relação de pai e filha ficou muito mais completa depois que comecei a acompanhar mais de perto. Na maioria das vezes, vamos eu e ela apenas, nos forçando a uma ajuda mútua, companheirismo, parceria, amizade e respeito”, conta.

Para ele, não há diferenciação de pai, filha, treinador, competidora. “Não consigo separar por estar sempre com ela nas provas e entrar com ela na pista, treinar no dia a dia. Mas não acho que nada atrapalha os resultados, tudo agrega e vivemos esse mundo 24 horas por dia, sete dias da semana. Em acampamentos ou em casa. Depois de cada passada, conversamos sobre a prova, buscando melhorar os erros, ver onde acertamos, enfim ajeitar os detalhes. Sempre com um diálogo sincero, corrigindo o necessário. E tem dado certo esse nosso jeito”.

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Valdemir e Bia

Há sete anos na modalidade, Beatriz Matos Martinez, 21 anos, de Glória de Dourados/MS, acredita ser um privilégio ser treinada e ter seu pai como apoio em todas as provas. “Nós sempre tivemos uma boa comunicação e um ótimo relacionamento. Só de olhar um para outro, já entendemos o que se deve ser feito. Quanto aos pontos positivos e negativos, acredito que temos mais pontos positivos em nossa sintonia do que negativos. Conviver dessa forma nos fez mais unidos e cúmplices, sempre com pensamentos de parceria mesmo”, reforça.

O que pode atrapalhar, na visão de Bia, é a cobrança por não errar. Não é apenas o treinador que está ali, mas o pai, então alcançar os objetivos têm um peso ainda muito maior. Até porque, não tem como se distanciar muito. “Por exemplo, quando chega véspera de competição, ou depois que acaba, confesso que ficamos alguns dias pensando no que dá para melhorar, o que deu certo, e o papo sempre fica mais nisso. Mas, ter um pai-treinador em casa é saber que tem alguém que te apoia, está com você em todos os momentos”.

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Osmir e Ekézia

Não tem como o treinador pedir dispensa, né? “Acima de tudo, a relação dessa forma nos dá a certeza de que ele acredita em mim, independente do que acontecer. Por vezes, me cobro muito e ele me acalma, dizendo que posso exigir um pouco menos de mim. Aí vejo o lado pai falando mais alto, o lado protetor. E com toda certeza, ter ele ao meu lado ajudou muito no meu crescimento profissional e pessoal. Ele me mostra não só como fazer em pista, mas como agir na vida. É um aprendizado que nunca esquecerei. Tenho muito orgulho dessa nossa parceria. E muito mais a agradecer a ele toda dedicação que mostra comigo e com meu cavalo”.

De Campo Mourão/PR, Osmir Eduardo Garcia também buscou aprender mais sobre os três tambores para orientar suas filhas. “Estou aprendendo mais a cada competição. Sinto que é algo que sempre quis por estar lá dentro da arena ao lado delas. Ser treinador das próprias filhas é uma prova de fogo, mas no final de tudo sempre entramos em um acordo. Na verdade, não tem como separar as duas coisas. Temos que nos unir para somar, sempre!”

Campeonato Nacional de Rodeio
Osmir e Raissa

A filha mais velha de Osmir, Ekézia Garcia, 19 anos, de Campo Mourão/PR, que começou a competir em novembro de 2012, afirma que ser treinada pelo pai é confiar que ele sempre vai treinar os cavalos, mesmo que tenha outros compromissos. “Ele acaba deixando algumas coisas de lado, só para se dedicar aos animais, ele ama esse esporte. Nós conversamos antes da passada e nos treinos sobre como achamos melhor e entramos em um acordo, temos mais intimidade, isso é um dos pontos positivos”, conta.

Para Ekézia, o ponto negativo, e a pior coisa que pode acontecer, é que quando não sai nada como planejado. “Acabamos discutindo sobre quem está fazendo errado e SEMPRE é culpa minha (risos). Acabamos misturando tudo porque, realmente, não tem como. Em casa, sempre falamos sobre os treinos, ficamos assistindo nossas passadas milhões de vezes”.

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Osmir e Raissa

Raissa Garcia, 15 anos, de Campo Mourão/PR, é a caçula de Osmir e também começou no mesmo ano que a irmã. Quando criança, a família inteira sempre andou a cavalo e é com gratidão que ela ama ser treinada pelo pai. “Sei que ele está sempre realmente preocupado comigo e tenta fazer o seu melhor nos treinos. Se eu for bem na prova, nós dois ficaremos felizes. O ponto negativo é que ele tem mais liberdade do que treinador e briga bem mas comigo, mais no final da tudo certo”.

No entanto, para Raissa, a melhor coisa de ter o pai treinador é que ele sempre vai estar ao lado, independente do que aconteça. “Meu pai vai tentar ajudar no que pode e, como ele mesmo diz, quando eu ou a minha irmã ganhamos, fica mais feliz que qualquer um. O que não tem jeito mesmo são as brigas, quando eu erro ele briga bastante, mas como eu disse em cima, no final da tudo certo. Tanto em casa quanto nos treinos, ele continua sendo pai. Não tem como dividir, e o respeito prevalece nas duas relações. Passamos muito tempo em casa analisando e buscando melhorar sempre”, finaliza.

Por Luciana Omena
Colaboração Amanda Gelly
Fotos: Cedidas

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