Neste artigo técnico, a médica veterinária Auroxochitl Monteiro Pinheiro fala ainda sobre a necessidade do parto assistido
A criação de cavalos é feita de histórias. E qual dentre elas nunca teve uma em que o principal potro neonato daquele ano, ou de algum muito especial em que nasceu, mas não conseguia se manter em pé? Ou ainda que não conseguia mamar, ou a égua não tinha leite?
Sobretudo, histórias como essas são mais comuns do que imaginamos. E a única presença que nos toma é a frustração, pois ali – mais do que grandes sonhos – estão inúmeros fatores de investimentos, tempo, e uma estação de monta fracassada. O que precisamos é tornar cada vez mais esse assunto conhecido e que ele faça parte dentro da nossa rotina no haras.
Por isso, a observação é necessária. Prática essa que nos faz aprender com eles, que nos faz entender os passos de como a sábia mãe natureza age. E nos faz tornar parte dela para auxiliar quando necessário.
Observar os lotes dos potros com as suas mães traz muita informação. Como eles são tão dependentes no começo e depois de um tempo só vão na égua mesmo para mamar. Como eles aprendem a ir no cocho tomar água, lamber sal e até brincar por muito tempo.
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Nesses momentos de observação, podemos ver se os potros se dão bem, ou se brigam no momento em que estão no cocho. Isso, sem dúvidas, acarretará importantes decisões.
Como, por exemplo, o caso de precisar retirar alguma égua do lote por bater em alguma outra. E, principalmente, por qual manejo de alimentação optar. Creep feeding ou lanchonete?
O nascimento..
Mas voltamos a falar do começo, pois sem isso não teremos as próximas fases e nem os próximos desafios. O nascimento, o momento mais esperado, aquela surpresa para avaliar imediatamente o sexo do mais novo integrante do haras. Mas não é só isso, precisamos saber se ele está com os parâmetros que se espera de um potro neonato “normal”.
A égua conseguiu parir sem alterações, ótimo! O umbigo foi rompido e o potro começou a vencer o maior desafio da vida dele: respirar por si só. O potro considerado normal com apenas 5 minutos de nascido já está na posição esternal. Além disso, os primeiros reflexos de sucção indicam que está tudo correndo muito bem.
Agora ele tem até uma hora para conseguir ficar em pé. Apoiando mesmo que parecendo não tão firme, mas permanecendo. Se acaso esse tempo começar a estender mais de uma hora após o nascimento, o potro neonato precisa de ajuda para ficar em pé. Sendo assim, a nossa intervenção será necessária, a qual vai dar uma força e apenas apoiá-lo.
Ficando em pé e com os reflexos de sucção, o potro já deve ir para perto da mãe – que se estiver sem alterações também estará de pé – para mamar. Ele tem que percorrer esse caminho em 2 horas após seu nascimento. Ou seja, temos mais uma hora para garantir que tudo esteja progredindo bem.
Assim, ele vai tentando localizar com o reflexo instalado já. A princípio, ele tenta por algumas vezes em partes diferentes do corpo, mas faz parte da descoberta. Conseguem ir percebendo a importância do parto assistido?
Esses são parâmetros fundamentais, pois além de nascer sem imunidade, o potro nasce com uma determinada reserva de glicogênio presente no fígado. Esta que é responsável pela energia desse animal até ele conseguir se reabastecer através do colostro, aí que faz sentido todo potro que não mama, só vai piorando seu quadro. Pela queda do glicogênio (e outros fatores que ele pode ainda estrar apresentando).
Parto assistido
Mas vamos falar do potro neonato normal, pois assim, se a cada vez treinarmos mais e mais a nossa capacidade de observação e saber identificar o que está normal, ficará mais fácil ao avistarmos um sinal de alerta. O potro que ficou em decúbito esternal com 5 minutos e ficou em pé até uma hora depois e após já procurou e encontrou o teto em duas horas após o seu nascimento está mamando é um sinal de que está tudo correndo muito bem.
E que provavelmente você irá precisar apenas nesse momento curar o umbigo com iodo 7% (primeiro dia), e esperar pelo mecônio. Agora, se algo não está progredindo e ele não mamou com até 2 horas de nascido, precisamos ajudar.
Neste caso, fornecendo o colostro da própria mãe que apenas é ordenhado e oferecido na mamadeira. Esta que deve estar posicionada no mesmo local dos tetos da égua, para ele já ir se encontrando.
Assim que a energia e a imunidade começam a interagir com o recém-nascido, ele já vai demonstrando pequenos sinais de atividade. Assim, deixando ele cada vez melhor para a próxima mamada que deve ser mais ou menos a cada 40 minutos, por volta de 100 ml.
Converse imediatamente com o seu médico veterinário se notar qualquer anormalidade. O tempo nesses casos é essencial para o sucesso, e ele irá avaliar a glicose do animal, entre outros parâmetros.
Equipes de assistência aos partos devem saber o que fazer, quando intervir, e o que podem ir adiantando até o médico veterinário chegar. Treinar bem a sua equipe, só aumentará as chances de sucesso.
Importância do colostro para o potro neonato
O colostro é super importante, pois ele que irá transmitir a imunidade passiva por conta de seus anticorpos. Protegendo, assim, o potro até que ele próprio consiga iniciar a produção dos mesmos.
Deverá ser mamado ou fornecido até as primeiras 6 – 12 horas de vida, pois nesse período o seu intestino consegue a maior e melhor absorção das mesmas. O potro precisa ingerir de 1,5 a 2,5 L de colostro nas primeiras 24 horas.
A avaliação física e laboratorial do colostro irá informar se ele apresenta uma boa qualidade, melhor avaliar com umas 4 horas após o nascimento. E ainda após umas 12 – 18 horas utilizar de um teste o IgG Check® que permite avaliar corretamente o nível de imunoglobulinas do tipo G no potro. Caso essa seja falha, o médico veterinário irá intervir conforme as necessidades.
As éguas de primeira cria, as primíparas, tendem a uma maior incidência de não ter o colostro, e não conseguem fornecer o mesmo para o potro. Ou ainda demoram um pouco para ‘descer’. Então, por mais que o neonato tenha o reflexo de sucção, e ainda esteja indo buscar no local correto, se não intervimos ele começa a entrar no quadro de alto risco.
Banco de colostro no haras
Ai entra a importância de se ter o banco de colostro no haras. Imediatamente se isso ocorrer vá e forneça o colostro do seu banco na mamadeira e que pode ser descongelado à temperatura ambiente, ou em um banho-maria adequado.
Sempre fornecer no local do teto da égua, para ele saber que está no caminho certo. Deixe o potro ir estimulando ela também, e junto com o seu médico veterinário que irá avaliar as condições da égua e entrar com o protocolo adequado para que ela venha a produzir o leite.
Observe sempre o local dos partos e se isso não pode estar deixando a égua ainda mais estressada. Conhecendo os seus animais, através da observação fica muito melhor decidir se ela ficará mais confortável com o parto em um piquete individual, piquete com o lote das éguas que vão parir (lembrar-se dos riscos de uma égua “adotar” o potro de outra) e ainda a baia, para a égua que sentir bem assim. Tudo é questão do manejo e o que ela está mais adaptada e sem dúvida o que causa o menor estresse.
Estabelecer o local correto que a égua ficará até parir, pois assim ela irá se ambientar e assegurar a formação de anticorpos colostrais específicos ao meio ambiente em que permanece.
A obrigação e cuidado é que seja sempre em um ambiente limpo e adequado, pois o potrinho recém-nascido adquire bactérias não somente pelo umbigo, mas sim pela boca também, em um momento em que tudo é absorvido de uma maneira muito intensa pelo intestino nessas primeiras horas.
As realidades são diferentes e precisam ser organizadas para todos os haras. Tornando assim o manejo prático, funcional e fundamental. Para que as melhores histórias se tornem as que seu potro que poderia não ter mamado hoje é o campeão nacional, ou ainda o amor incondicional de alguém.
Por Auroxochitl Monteiro Pinheiro, médica veterinária CRM PR 11790, especialista em reprodução equina e responsável pela Central ESJ de Reprodução Equina
Crédito das fotos: Divulgação/Auroxochitl Monteiro Pinheiro
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