Essa é uma continuação do tema ‘Método Científico visita o Quarto de Milha’
Para essa terceira coluna, de forma dinâmica, fui questionado sobre o passo a passo da pesquisa. Veja:
Já é possível fazer uma avaliação da sua coluna? Vale a pena continuar?
Dr. Marcio: A resposta ao primeiro número publicado foi muito acima do que eu esperava. Fiquei muito impressionado com a quantidade de contatos pessoais que os ‘quartistas’ fizeram, pontuando algumas dúvidas e fazendo sugestões. Sempre disse e repito que o ‘povo desse nosso time’ é muito bom e pensa bem, além da paixão pelo esporte hípico. Meu esforço em transmitir o que penso com clareza, vai dobrar.
O tema de hoje vai na mesma linha dos outros dois?
Dr. Marcio: Sua colocação abre espaço para mostrar como o mundo das ciências é fascinante e amplo.
No primeiro trabalho que publicamos, usei o método retrospectivo, isto é: fomos buscar no passado, nos arquivos da ABQM e do SGP, a história dos últimos três potros do futuro de três tambores e avaliar se, pelo passado dos finalistas no PF da ABQM seria possível prever o desempenho que tiveram.
No segundo tema, ‘O peso da genética da mãe é maior do que o do pai, tratamos de sobre uma revisão dos escritos sobre o assunto.
Agora, nessa terceira parte, estou apresentando um trabalho prospectivo, ou seja, um estudo que será conduzido daqui para frente e pretende ver se a proposta é verdadeira. A proposta é: Podemos prever o desempenho de um potro em pista desde sua doma? No mundo científico, chamamos estes estudos de prospectivos ou ‘proféticos’.
Quanto tempo vai demorar para responder isso?
Dr. Marcio: Pois é. Fazer um estudo desse porte leva tempo, envolve um grande número de potros e exige muita persistência. Serão avaliados 30 potros, domados durante quatro meses pela mesma pessoa e com a mesma técnica (doma racional). O desempenho em pista desses animais será acompanhado por três anos.
Trinta potros?
Dr. Marcio: É isso mesmo. Serão trinta potros acompanhados por três anos, dez potros por ano. Um estudo desse porte exige o encontro de parceiros com qualidade: que tenham persistência e sejam apaixonados por esse esporte. Que aceitem também os riscos do investimento.
Foi assim que nos unimos: Ivandilson da Costa Melo (o Ivan, do Haras Flamboyant), sua filha Isabella, eu, Ana Luiza – minha filha (representando o Haras ST), e o Marcos Toledo Filho, responsável pelo centro de treinamento.
Tivemos um patrono que trabalhou intensamente conosco e não está mais entre nós. Há de ser feita uma homenagem especial ao Dr. Kiko. A ele é dedicado esse estudo.
As duas famílias, representando os dois Haras envolvidos, Ivan Melo, Isabella,Marcio Tolentino, Ana Luiza e Flávia Tolentino Brianti.
Gerações que garantem a persistência. Marquinho Toledo trabalhando um potro em círculo: Dr. Marcio considera
o mais importante movimento na “mecânica do cavalo”. Os movimentos do potro são tabelados e a cada um deles é atribuída uma nota de um a quatro: 1 (ruim),
2 (regular), 3 (bom), 4 (ótimo). Toda primeira segunda-feira de cada mês esta avaliação é feita pelo
Dr. Marcio, Ana Luiza e Marquinho. Assim é construída a tabela que você vê.
Na foto Dr. Marcio com a Ana Paula Zillo Toledo.
Quais serão os itens avaliados em cada futuro atleta?
Dr. Marcio: Apresentei até agora o material do trabalho. Vamos agora aos métodos, que estão resumidos na tabela a seguir.
Então, ‘alfabetizar’ um cavalo é ensinar a ele os movimentos básicos da equitação. Isso serve para qualquer esporte hípico, seja clássico como o adestramento, salto etc., seja o nosso Três Tambores. Os passos e itens da ‘alfabetização’ estão provados faz séculos: primeiro pelos orientais e depois pelos europeus.
Isso tudo quando os cavalos ainda eram veículos de transporte e guerra, muito antes de serem atletas. Tenho origem no hipismo clássico (adestramento), e sou testemunha pessoal disso tudo.
A doma tem que ser leve, sem esporas ou chicotes, rédeas suaves, sem ‘pesar’ a boca do animal. Carinho e suavidade!
- CÍRCULOS.
Os mais importantes movimentos são os círculos, à direita e à esquerda. Primeiro, círculos abertos (diâmetros entre 20 e 25 metros) e depois fechados (diâmetro entre 10 e 12 metros). Os círculos devem ser feitos em três velocidades: passo trote e galope.
Avaliamos se o potro passa de uma velocidade para outra com facilidade e se galopa dos dois lados na mão e pé corretos. A posição da cabeça, pescoço e garupa também são muito importantes porque indicam a capacidade de flexionar a coluna.
O treinador vai fazendo pequenas correções e estudamos a resposta do potro a elas. Expressiva maioria dos cavalos são canhotos (85% trabalham melhor na mão esquerda). É por isso que na prova dos tambores vira-se um à direita e dois à esquerda.
Os círculos têm que ser perfeitos, cabeça e garupa para dentro. Se a ‘paleta cai’ em vez de círculo o animal faz uma elipse Há exercícios para correção disso e o problema tem que ser precocemente corrigido senão vai derrubar o tambor ou abrir muito o virador. Virar os tambores significa fazer círculos (ou parte de um círculo) com diâmetro muito pequeno.
- ESBARROS, NO GALOPE COM A MÃO DIREITA E ESQUERDA
Depois de fazer os círculos, pedimos que o cavalo saia em linha reta no centro da pista e ao galope (é claro que no início da doma o exercício é feito ao passo e depois ao trote). Avaliamos aqui a colocação da garupa (reunida, baixa, com boa flexão da coluna) e a posição da cabeça nuca e pescoço.
Não é propriamente o esbarro do cavalo de Rédeas, mas uma parada suave. O adestrador deve fazer o mínimo toque nas rédeas, sem reação do cavalo ao bridão. Parar ao comando de voz é fundamental. Chamamos mais de parada do que esbarro, e deve ser feito na mão direita e esquerda.
- RECUO
Terminou de esbarrar é solicitado ao potro que recue. Vale aqui a mesma observação feita para o esbarro. O adestrador deve fazer o mínimo toque nas rédeas, sem reação do cavalo ao bridão. Recuar ao comando de voz é fundamental.
- DOCILIDADE, ATENÇÃO E AGILIDADE
Um cavalo ideal deveria ser dócil (para qualquer amador montar), atento aos comandos mais leves e muito ágil (corredor do clube dos 16!). Dificílimo achar tudo isso num só cavalo. Se existir, vale um milhão: de dolares!! Nosso objetivo é chegar o mais perto possível.
Todos os itens acima são avaliados nos quatro meses de doma. Não anotamos mais os valores a partir do segundo mês, porque o potro deve estar bom ou ótimo em todos eles. No terceiro e quarto mês acrescentamos mais os dois itens abaixo.
- PARADA E ROLL BACK
Esse movimento é mais avançado, exige um nível maior de doma e adestramento porque em primeiro o cavalo tem que saber parar, segundo fazer círculos muito curtos e terceiro mudar de velocidade rapidamente.
No início, o adestrador usará a cerca lateral da pista para o treino e no final da doma o potro deve estar fazendo o exercício no centro da pista. Ao parar e girar para a esquerda o potro estará apoiando seu peso no posterior esquerdo (mão e pé de onde vinha galopando) e seu pé direito fará força de impulsão para frente e para fora do círculo. É exatamente o que ele fará no segundo e terceiro tambor.
Ao fazer o roll back para a direita ele estará treinando virar o primeiro tambor sendo o posterior direito de apoio do peso e o esquerdo de impulsão da frente e para girar. Sabe-se isto pelo estudo da mecânica dos movimentos do cavalo. Já foi dito que desde o século 19 os ingleses alemães e franceses estudam com detalhe este assunto. E vale para todos os esportes hípicos. Em nosso estudo avaliamos a parada com roll back a partir do segundo mês de doma.
- PERCURSO DOS TRÊS TAMBORES
Também a partir do segundo mês o potro começa a fazer o percurso dos Três Tambores. Inicialmente ao passo depois trote e finalmente galope. Ao darmos nota valorizamos muito neste item a distância do tambor em que o cavalo muda de velocidade para fazer o giro.
Isto é importante indicação da sua atenção aos tambores. Se a mudança da velocidade for muito perto dos tambores, o giro pode ser difícil e o animal ‘passa’ do ponto. Por outro lado, parar muito antes indica possibilidade de antecipação. E deve ser precocemente corrigida.
- FINALMENTE AS OBSERVAÇÕES FINAIS
A avaliação final contém itens subjetivos, mas são importantes. Já consideramos aqui qual treinador e seu estilo seria mais indicado para fazer a campanha desse potro.
E após esses quatro meses de trabalho na doma, qual o próximo passo?
Dr. Marcio: O potro será encaminhado para diferentes treinadores e seu desempenho em pista acompanhado minuciosamente. Cada treinador e seu estilo pessoal receberá o potro que pensamos ser mais adaptado a ele. É fundamental respeitar-se as características particulares do cavalo e do cavaleiro.
Que linhagem genética está sendo escolhida para esse trabalho?
Dr. Marcio: As matrizes são as do Haras ST e do Haras Flamboyant. Aliás, elas têm uma genealogia muito semelhante. Com relação aos garanhões: 60% (seis potros por ano) dos potros são filhos do ST Dashin Leo, e por isso entre nós chamamos esse estudo de ‘PROJETO DASHIN LEO’, nome, aliás, criado pelo Kiko.
O conteúdo desse estudo foi publicado originalmente na Revista Tambor & Baliza, dividido em três edições. O Dr. Marcio Tolentino é Médico Gastroenterologista, Criador de Cavalos Quarto de Milha há mais de 40 anos e estudioso na área de cruzamento