Começando sua vida no esporte aos nove anos de idade, o competidor possui 5.215,75 pontos na ABQM com grandes vitórias nos Três Tambores
A história de Décio Talon com os Três Tambores podemos dizer que é um tanto diferente, já que na família ninguém mexia ou gostava de cavalos. Mas o destino o levou a ser um expoente treinador no esporte. Destino o qual foi trilhado por ele, já que na verdade gostaria de ser médico, acabou fazendo faculdade de Direito e tornou-se advogado. Nunca exerceu, pois seguiu o caminho de sua verdadeira vocação, o treinamento de cavalos.
Para ele, Bauru foi a cidade que lhe proporcionou as grandes oportunidades no mundo eqüestre. Foram dois momentos, quando jovem junto com Vaguinho e depois como um treinador no Haras Santo Antônio e agora no Haras Dona Claudina. “Quem me apresentou o esporte foi o Robertinho Ulhoa, estudávamos juntos. E como gostava muito de cavalo pedi para meu pai um de presente e ficava na fazenda de um amigo”.
Vaguinho [Simionato] ele conheceu pela Revista da ABQM. “Eu gostava de cavalo, já fazia Tambor em uma escolinha em Sorocaba/SP, no Centro Hípico Pagliato, com o Oliveira, depois o Lincoln Gimenez, Adilson. Tinha um Appaloosa, depois que ele morreu desanimei. Meu pai pegou a revista e vimos muitas páginas do Vaguinho. Dai meu pai falou ‘esse cara deve ser bom. Viemos a Bauru para conhecê-lo, escolhemos um cavalo”, relembra Décio.
Na época esse cavalo foi a Invicta Proud KRB, que deu muitos títulos a ele. Que dessa forma passou a treinar com o Vaguinho. O tempo foi passando e Décio cada vez mais envolvido com os cavalos. Já na faculdade, o pai teve um sério problema financeiro. Para se manter estudando, passou a viver remuneradamente do cavalo. Virou treinador. “Quem me deu oportunidade foi o Dr. Marcos Freitas quando fui trabalhar no Haras Santo Antônio. O começo da minha trajetória aos 19 anos”.
As coisas foram dando tão certo, que Décinho, como é conhecido no meio, montou um Centro de Treinamento junto com Daniel Freitas, na beira da rodovia em Bauru, com boa localização. “Nessa época comecei a pegar cavalos de fora, e as coisas foram dando certo. Eu me formei, tirei OAB, mas já estava bem estabilizado profissionalmente no cavalo, então não mudei nada”.
Após alguns anos trabalhando em parceria, Décio teve proposta para trabalhar no Haras Raphaela. Foram três anos em Tietê até voltar a Bauru, há dois anos, tornando-se treinador do Haras Dona Claudina. Tem 35 animais em treinamento. Sempre destaque, começou a despontar mais nas pistas quando desafiou a si próprio. Na época no Haras Santo Antônio, montando a primeira geração de Castanho Red.
Dr. Marcos quando me deu a oportunidade de montar profissionalmente ninguém me via assim, falavam que eu era Amador. Então pensei em provar para todo mundo que eu era capaz. Com a primeira geração de potros do Castanho Red eu ganhei primeiro, terceiro e quinto na categoria Cavalo Iniciante e ganhei o Potro do Futuro ABQM. Nas provas de potro sempre colocava três cavalos entre os dez melhores entre mais de 100 potros inscritos”.
Assim que consegui fazer seu nome no meio. Nem ele mesmo esperava que fosse ter a oportunidade de montar tantos potros com talento que o ajudasse a construir uma carreira de forma rápida. “Eu era Amador, meus pais me sustentavam. E quando meu pai teve problemas eu perdi todos os meus cavalos. Para continuar estudando eu tinha que fazer alguma coisa e a única coisa que eu sabia fazer era montar e deu certo!”, relata Décio.
Na visão dele, duas regiões são as maiores em concentração de cavalos de Tambor e de oportunidades. “Em minha opinião, Bauru e Jaguariúna, em São Paulo, são o centro do cavalo de Tambor. Bauru é bem no centro do estado e todos os lugares que a gente anda para competir não ultrapassam de 350 quilômetros de distância. Se quiser andar só 100km e correr todos os finais de semana, tem provas para isso”.
Ele relata que esse é um dos fatores que o seduzem a manter seu centro de treinamento na cidade. “É importante, pois as despesas diminuem. Também é possível ficar mais tempo em casa treinando. Não tem que sair um dia antes, se deslocar tanto, ficar semanas fora”. Outro fator que foi bastante comentado sobre Bauru, além da localização, é o tipo de solo. E Décio pondera sobre o assunto no que contribui para seu dia a dia.
“O clima aqui é muito quente e solo é arenoso, o que dá conforto e qualidade para o cavalo trabalhar, porque não dá dor muscular. É difícil um cavalo ter lesão por impacto, pois é um solo que tem bastante areia, por ser uma areia natural, ajuda a criar confiança nos seus animais. Então acho que sim, o solo ele ajuda muito no trabalho, pois o principal para construir um cavalo atleta de alta performance é ter qualidade e conforto”.
Decio fala também dos criadores que estão em Bauru, que investem em genética e fomentam a raça Quarto de Milha. “Hoje nós temos vários criadores ao redor aqui, eu não vou citar todos porque senão vou esquecer-me de alguns. Mas alguns que temos aqui são ícones da raça, são pessoas que estudaram e investiram na genética. Não só na genética da região, mas do Brasil inteiro. São pessoas que investiram e trouxeram cavalos de fora, investiram em aperfeiçoar esse patrimônio genético”.
Na visão dele, os criadores mais antigos da raça que estão em Bauru, há 30, 35 anos, “são os fomentadores e isso é bom porque a gente está na região que centraliza muito esses criadores. Bauru por ser uma cidade com muitas provas perto, ajuda o treinador na busca sempre por novos conhecimentos, cursos com renomados treinadores americanos, trocando ideias com colegas de profissão e aperfeiçoando cada vez mais suas técnicas e conquistando inúmeros títulos”.
Atualmente Décio soma 5.215,75 pontos de Registro de Mérito na ABQM, computados em 2914 provas corridas (até 15/08/2019). Segundo o treinador, aos 31 anos de idade, já treinou uma média de 500 cavalos e montou em mais de mil. Para se manter em alto nível é preciso dedicação, abdicar de algumas coisas e planejamento. Em 2018, Décio correu em 38 finais de semana, sendo que o ano teve 48.
“Para você se manter no nível alto precisa correr toda semana, fazer sua tropa, fazer o revezamento, não é fácil. Enquanto estiver no Top 5 na ABQM, tem que se dedicar. Os rankings são um termômetro, porque acho que ajuda a gente se manter. É ele que enquadra o perfil de cliente, serve de base e de orientação para as pessoas que têm um cavalo bom e vem te trazer. Se você está no topo do ranking, tem mais oportunidades de ter cavalos bons pra montar”.
E na história de um treinador tem sempre um animal que marca mais, que o ajudou a fazer história. No caso de Décio Talon ele remete parte do mérito de estar entre os melhores a ST Taboquinha. “Tem muitos cavalos que gosto demais, mas não posso falar outro se não for a Taboquinha. São sete anos com ela, ais 1070 pontos na ABQM, mais de R$ 315 mil em prêmios. É a única égua que ganhou duas vezes o Grand Prix Haras Raphaela na melhor média, que tem mais 16 no Brasil – são 46 tempos na casa dos 16 segundos -, então não dá pra falar de outra se não for ela”.
Emocionado, Décio afirma que existem animais do nível dela, com potencial de dar mais marcas, só que em constância e história foi ela que muitas vezes sustentou a carreira dele. Mas não é só de cavalo que vive um treinador, de estudos também. “Acho que o estudo ajuda abrir a cabeça, a ampliar seu horizonte, a se programar. Acho que é preciso ter um projeto de vida que consiga planejar o passo a passo do desenvolvimento da sua profissão e o seu desenvolvimento pessoal”.
Sem objetivos para o futuro, Décio acredita que ninguém evolui. “Acho que você não pode pensar só no hoje, tem que pensar que amanhã você vai estar com uma idade e não vai poder ter um nível alto. E essa é uma questão que eu prezo muito, me projetar e criar uma estabilidade que daqui uns anos quem sabe, se eu não aguentar mais trabalhar em alto nível, esteja bem estabilizado. Poder exercer minha profissão por prazer e não mais por necessidade”.
Décio não está sozinho na empreitada do dia a dia no treinamento com os cavalos. Tem dois auxiliares que o ajudam e o que contribui muito também para o rendimento do trabalho é a funcionalidade do haras. “Nós montamos em três sem parar e como o haras aqui é bem funcional, o serviço rende muito. A gente não anda mais de 50km da pista para as baias. A quantidade de cavalos que você consegue montar no dia está completamente ligada ao seu manejo”.
E o que ele fala tem muita lógica: Quanto mais rápido for o manejo, rende muito mais. “A distância atrapalha um pouco a produtividade no meu ponto de vista, porque hoje em dia o tempo é dinheiro, é produção, então se você conseguir agregar num espaço menor a sua produtividade, consequentemente, a sua produção é muito maior”. E ele finaliza falando de seus projetos e agradecendo sua família, que é a base de tudo, e a todos que contribuíram de alguma forma para ele chegar hoje onde está.
“Quero fazer um ano bom, ter alegrias com meus cavalos, quero dar alegria para os meus clientes, principalmente ter paz no coração para fazer meu trabalho direito. Saúde é o principal, eu acho que sem saúde você não vai a lugar nenhum. Pedir a Deus que quando volte das provas elimine rápido as dores do corpo, porque tem provas que a gente se esgota mesmo, dá mais de 40 passadas numa prova. Se você estiver com o corpo bom, com a mente boa, as coisas vão dando certo, acho que é o principal! Aproveito para agradecer aos meus pais, porque se não fosse a educação que eles me deram , não chegaria a lugar.”
Por Verônica Formigoni
ESPECIAL Bauru – Revista Tambor & Baliza – Ed. 83
Fotos: Beto Negrão