Fazenda Caruana, uma marca de expressão no Quarto de Milha

Há 47 anos buscando as melhores genéticas, Caruana é casa do reprodutor mais pontuado de todos os tempos da ABQM, El Shady Zorrero

Fauzet Farha construiu sua história na cidade de Bauru. A paixão pelo campo herdou do pai, de quem quando criança ganhou seu primeiro cavalo, um petiço chamado Pingo. Trabalhou em grandes laboratórios da época, teve outros trabalhos, como vendedor de peças de carro e gerente de posto de gasolina, pois era muito bom com contas.

Até comprar uma propriedade em 1969 para criar gado, que logo já estava cheia de cavalos. “Comecei com gado, fiz as divisões para gado por alqueire para facilitar a lida e o manejo. Mas achei que a fazenda com o gado não ia render o suficiente que eu gostaria. Um amigo de Araçatuba, que criava, me fez ver que eu podia mexer com cavalo. O gado era o convencional, três cabeças por alqueire na época, então 180 alqueires davam 500 cabeças. Vendendo, não ia render o que eu gostaria”.

E isso o incentivou a focar no cavalo. “Falei para esse meu amigo das dificuldades, porque teria que fazer um investimento na época e ele disse eu não me preocupar. Me ajudou muito.”, lembrou Fauzet. Em 1969, a ABQM foi fundada em Bauru, pelos amigos de Fauzet Farha, incluindo Heraldo Pessoa, e ele acompanhou tudo de perto. Em 1972, adquiriu seus primeiros exemplares da raça Quarto de Milha: Malandro e T’ Bonne.

“Eles foram os dois meio sangue que comprei, do Heraldo e do Guilherme. Eu fui devagar, em 1975 fiz minha primeira viajem para os Estados Unidos, junto com uma excursão da ABQM, pessoal de Prudente. Nessa época tinha que viajar de terno, era chique. Fui, observei, gostei do que vi, mas não comprei nada”.

El Shady Zorrero
El Shady e Paulo Farha. Foto: Beto Negrão

Fauzet já estava envolvido com os esportes e fez parte da fundação do Clube de Laço. Sempre com uma mente empreendedora, voltou aos Estados Unidos para importar oito animais, dois garanhões – Wigghy Reed Bar e Second Bar Bando, e seis fêmeas. “Quando fui novamente, comprovei tudo que meu pai falava de lá, que era um país diferente e que se as coisas eram boas lá, podiam ser aqui também”, declarou.

Em 1977, o criador deu um outro passo no aprimoramento do plantel e voltou aos Estados Unidos buscando genéticas que viessem a agregar ao criatório da Fazenda Caruana. Importou um lote de 54 animais, entre eles, Trouble Two Times, que veio a ser um dos expoentes da sua criação e da raça.

“Nessa viajem, achei bons animais no sul do Texas, e um potrinho em especial que estava brincando com as galinhas me chamou atenção. Era o Trouble, mas ele não estava à venda. Como tinha escolhido outros animais também, eu falei pressionei para que ele estivesse no lote. Paguei por ele em cash”, sorri Fauzet.

Na época, ele queria o Quarto de Milha, mas não havia um direcionamento se era Tambor, Baliza, Apartação. Acabou ficando íntimo dos americanos, viajava muito para os Estados Unidos e sempre trazia novidades. Tornou-se um ponto de referência de compra e venda. “Cheguei a ter uns 150 a 200 animais com éguas comuns para fazer meio sangue. Vendia por telefone. Pessoas que eu nem conhecia pessoalmente me ligavam. Ele descrevia o animal e as pessoas compravam.

Fazenda Caruana
Caruana

A Fazenda Caruana estava em outro patamar naqueles tempos. Toda a família já estava envolvida com os cavalos, com o Quarto de Milha. Fauzet, a esposa Virgínia, as filhas Ana Laura, Ana Paula, Ana Cláudia, e o filho Paulo. Além dos funcionários, que vibravam com cada potro que nascia.

Fauzet procurava sempre o melhor e na década de 80 começou a perceber que poderia direcionar seus animais para o esporte através dos leilões. “O Trajano leiloeiro fazia os leilões e eu vendia o meio sangue fácil. Então pensei que ele podia vender e esses animais eram na maioria para crianças e iniciantes no esporte. Era um comércio firme, porque o avô comprava cavalo, o tio comprava cavalo, a família se envolvia”.

A era Trouble Two Times

Trouble Two Times foi um grande divisor da Fazenda Caruana, era o cavalo do Paulo Farha. Foram muitas aventuras, conquistando muitos títulos. O conjunto era a sensação fazendo Três Tambores, Seis Balizas, Laço Individual. Logo, tornou-se um grande reprodutor do Quarto de Milha. “Eu vinha para a fazenda e passava dia com os peões, olhando o gado. Eu gostava e já montava a cavalo. Vi o Trouble potrinho e fui me envolvendo cada vez mais. Ele me deu um grande impulso nos esportes equestres. Era um animal dócil, inteligente e habilidoso”, recordou Paulo.

Filho de grandes nomes do Quarto de Milha americano, Reger’s Skip e Spooky Trouble, Trouble produziu 402 filhos registrados, que somam 3284,5 pontos na ABQM. Também é um avô de qualidade extraordinária, líder de estatísticas como avô materno. Nesse período, Paulo e Claudinei Ribeiro competiam pela Fazenda Caruana, cada um em uma categoria. Ganharam muitos prêmios nos mesmos eventos, montando também, posteriormente, outros animais.

Fazenda Caruana
Trouble Two Times

Chegada de Shady Leo

Os anos foram passando, com Fauzet acompanhando o processo de evolução da raça e sempre trazendo coisas novas dos Estados Unidos. Até que Paulo se inteirou da criação e os dois traçarem um novo rumo para a fazenda. Na década de 90, ele assumiu a administração da propriedade e idealizou novos projetos para a Caruana.

Em 1996, mais um grande raçador do Quarto de Milha veio se integrar à Caruana, Shady Leo. O tordilho foi domado e treinado no Haras 4 Irmãos, fez sua carreira reprodutiva com Márcio Tolentino, no Haras ST, e foi excepcional. Na Caruana, chegou aos 16 anos, auge de sua vida reprodutiva. Paulo usou-o para cobrir éguas Trouble Two Times e foi uma das melhores genéticas da fazenda.

Um ano depois, em comemoração aos 25 anos do criatório, foi realizado o 1º Leilão Fazenda Caruana, apresentando ao mercado o resultado de todo trabalho dedicado ao aprimoramento do plantel, bem como os resultados de outros criadores convidados. Foi um sucesso, tonando-se tradição. A partir de 2000, a Caruana chegou ao seu auge com resultados expressivos nas pistas, em várias modalidades de Trabalho, alcançando a liderança no ranking de criadores da ABQM.

Novos sangues no criatório

Paulo estudou a importação de animais para diferentes modalidades de trabalho e adquiriu garanhões com os melhores pedigrees do país. Hobby Top Cody, Don’t Question It, Mister Slydun Pine e Missin James passaram a integrar o plantel Caruana. Juntamente a eles, novos nomes do Quarto de Milha brasileiro começaram a ganhar destaque, especialmente El Shady Zorrero, filho do líder de estatísticas Shady Leo.

Fazenda Caruana
Caruana

“Isso é muito dinâmico, teve a fase do Trouble, do Shady Leo, e hoje é o El Shady Zorrero.  Temos também que se adequar e buscar, porque criar é isso, selecionamento genético. Você não pode se fechar. Cada dia, cada ano que entra, você tenta novas cruzas, não é uma matemática, é probabilidade. Muita coisa dos últimos anos de novas linhagens, a gente trouxe, tanto como reprodutor como matrizes, para poder cruzar com as linhagens nossas que não abro mão. Muitos dos americanos que estiveram no Brasil falaram que era uma pena não terem essas linhagens lá”, declarou Paulo.

E pensando no que os americanos disseram, Paulo conseguiu fazer com que essa genética chegasse aos Estados Unidos. “Agora a gente também está produzindo lá. Nós vendemos, e apesar de ser precoce, estão começando a domar os potros. Eles estão encantados com os animais. Então selecionamento é isso, é misturar um com o outro e tentar buscar um indivíduo melhor”.

Novos projetos

A Fazenda Caruana conta hoje com plantel de 750 animais, já chegou a ter quase 1000 exemplares da raça. Nesse número engloba receptoras, potros, éguas, animais de competições e os garanhões.

“O trabalho é muito dinâmico em todas as fases. A parte da reprodução, que são sempre de três a quatro veterinários trabalhando; os potros e os animais de competição, em cada setor tem uma equipe de trabalho; além da agricultura, a produção de feno, somos autossuficientes. Esse ano começaremos a vender. Nesse setor estamos nos aperfeiçoando. Assim nosso time é formado por 18 funcionários, a Caruana tem hoje 220 alqueires”.

Fazenda Caruana
Caruana

Os projetos para uma nova era da Fazenda Caruana estão baseados em dois conceitos: melhoramento e aprimoramento, sinônimos. “Os projetos são melhorar, melhorar, melhorar, sonhar e buscar, ter foco! Nos últimos anos estamos se readequando, reinventando, melhorando muitas coisas. Somos muito rigorosos, eu sou muito rigoroso, exigente comigo mesmo”.

“Por isso que digo, tem muita coisa aqui que nós temos que melhorar e nós estamos no caminho. Temos um patrimônio genético, mas vem vindo aí uma Caruana muito mais fortalecida. Vai vir muito em breve, muita coisa sendo construída aqui dentro do silêncio, mas que vai fazer muito barulho”, contou Paulo, fazendo um leve suspense.

Esse amor excede gerações. Os filhos de Paulo, Thomaz, Thales e Lorena, foram, assim como ele, criados nesse meio. São competidores de Três Tambores e Seis Balizas e ajudam no currículo de título da Fazenda Caruana. Hoje os meninos estão fazendo faculdade, uma nova fase, mas com a paixão que eles têm, voltarão em breve. Não pararam, apenas deram uma pausa.

Fauzet e Paulo Farha falam da importância do cavalo em suas vidas, duas gerações da família, mas a opinião sobre os cavalos é compartilhada integralmente. “O cavalo é fundamental, forma a personalidade, as crianças gostam de treinar, de competir, aprendem a ganhar, perder, se superar. Para ir a uma competição, precisam treinar e depois dar banho, etc . Cria um senso de responsabilidade”.

Caruana

“São obrigações com os cavalos que transportam para a vida. A atividade vai formando o caráter dos jovens, envolve-os com algo sadio. Ainda mais que a juventude está nessa era tecnológica, celular, computador, ipad. Que é bacana, mas o cavalo tira um pouco disso, levado a essência do ser humano de convivência”, complementou Paulo.

E Fauzet Farha finaliza: “o cavalo me deu muita alegria, uma meta de vida. Mexo com cavalo pela satisfação de ter de mexer com o animal, não sei se é a mesma coisa. Tem gente que gosta de colecionar quadros, ir no museu. Outro gosta disso, outro gosta daquilo. Eu gosto do cavalo! Não trabalho só comercialmente, trabalho com prazer, tanto é que eu tenho aqui nas baias uma meia dúzia que não serve mais, mas serviu a nós. Então, continuam comendo, bebendo e sendo tratado. Não estão à venda, fazem parte da história. Acredito que depois do cachorro, o melhor amigo do homem é o cavalo. Ele nos ensina muito.”

Por Verônica Formigoni
ESPECIAL Bauru – Revista Tambor & Baliza – Ed. 83
Fotos: Cedidas/Arquivo

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